13/05/2018

Idosa de Artur Nogueira conta como criou 5 filhos lavando roupas

DIA DAS MÃES: Aos 81 anos, Dona Maria relembra os desafios que superou por amor aos filhos

Noemi Almeida

A senhora faz uma pausa reflexiva enquanto tenta lembrar do passado. “Quantos anos eu tenho?”, pergunta para os filhos sentados em volta da mesa. Maria Aparecia Pires, de 81 anos, tem dificuldades para lembrar a idade, mas narra com clareza os momentos de luta vividos por ela e seus cinco filhos.

Com voz baixa, Dona Maria, como é carinhosamente chamada, relembra sua infância ao lado dos muitos irmãos, que nem sabe quantos são. “Quando saí de casa tinha doze anos, mamãe tinha um filho por ano. Acho que devia ter uns onze irmãos”, sorri, envergonhada por não lembrar. Filha mais velha, Maria saiu de Minas Gerais em 1948 para trabalhar em São Paulo a fim de ajudar com as despesas. “Foi uma madrinha minha que me trouxe pra cá, minha mãe confiava muito nela”, explica.

Em São Paulo, Dona Maria passou bons e maus momentos. “Lembro da casinha onde morava. Era bem pequena, no distrito de Marsilac. Ficava bem do lado da linha do trem”. Ela conta que trabalhou de empregada doméstica na casa de muitas pessoas diferentes. “Não era fácil, mas lá eu aprendi quase tudo o que sei sobre cuidar da casa”. Ali, conheceu o ex-marido, soldado do exército, com quem se casou em 1952, aos dezesseis anos.

Maria aprendeu que uma boa esposa segue o parceiro aonde quer que ele vá. Por isso, depois de casada, mudou- se com ele para Artur Nogueira. Ainda com dezesseis anos teve seu primeiro filho e parou de trabalhar para dedicar-se em tempo integral ao bebê. Ele faleceu depois de quatros anos após receber uma vacina errada. Maria teve a segunda filha, Isolina, em casa e com auxílio de uma parteira. “Ela nasceu em Conchal, minha filhinha. Na época não tínhamos muitos recursos e ela morreu depois de sete dias”, conta a senhora com pesar e saudade.

O trabalho do esposo fez com que a família tivesse que se mudar diversas vezes. Maria morou em Conchal, Hortolândia,  Monte Mor, Campos Elísios (SP) e Campinas. Em 1968, com 31 anos e cinco filhos, ela retornou a Artur Nogueira. “Alugávamos uma casinha na rua 1º de Janeiro. Era uma rua de terra, a cidade era pequena, e conhecíamos todo mundo”, comenta a senhora. A vida era tranquila até que o marido a deixou.

“A história é engraçada”, conta a idosa. “Éramos muito católicos e frequentávamos a igreja. Meu marido conheceu uma freira, ela largou o convento e os dois fugiram juntos para o Ceará”. O ocorrido, que não aparenta te-la abalado, é confirmado por seus filhos ao redor da mesa. “Pra ser sincera, não liguei. Fiquei focada nas minhas crianças, que ainda eram bem pequenas”, fala. “Eles eram (e são até hoje) a coisa mais importe que tenho e pela qual eu mais me dediquei”.

Maria precisou voltar a trabalhar para cuidar das crianças e não encontrou dificuldades ao retornar ao mercado. Ela já tinha experiência em lavar e passar roupa e, com esse trabalho, mais a colheita de algodão em alguns meses do ano, garantiu que sua família tivesse o sustento. A idosa conta que, como alguns dos seus filhos eram pequenos, deixava a filha mais velha cuidando dos outros, enquanto o filho mais velho ajudava trabalhando na roça. “Deus sempre me abençoou pois, depois da separação, fiz muitos amigos que ajudavam a cuidar das crianças”. Mesmo assim, Maria nunca deixou de se preocupar.

Quando os filhos de Dona Maria cresceram, passaram a trabalhar também. “Com treze anos minhas meninas já cuidavam de outras crianças, faziam faxina e uma delas era assistente de escritório”, relembra. Apesar de todos se empenharem para a renda da família, a idosa afirma que sempre colocou como prioridade os estudos das crianças. “Estudei só até a quarta série, mas gosto muito de ler. Queria que meus filhos fossem melhores do que eu”.

O empenho e qualidade com que Maria lavava e passava fez com que ela conquistasse como clientela a alta classe de Artur Nogueira. “Gosto de lavar à mão e sei como se desamassa todos os tipos de tecido, principalmente linho”, orgulha-se. A idosa, que na última semana ganhou de presente sua primeira máquina de lavar, diz que não sabe se algum dia vai chegar a usá-la. “Gosto das coisas assim”.

Dona Maria conta que, uma vez, eles quase ganharam uma casa. “Acho que foi na época do prefeito Rubinho. Me inscrevi para ganhar uma das casas populares e meu nome foi chamado”, relembra. O problema é que naquela época, mulheres separadas não podiam adquirir imóveis sem a assinatura do cônjuge. Maria não ganhou a casa. Anos depois, após a venda de um imóvel do ex marido, em Campinas, a família conseguiu ter sua primeira casa própria em Artur Nogueira.

Retorno inesperado

Numa manhã de 2003, Dona Maria recebe uma ligação inesperada. “Ouvi a voz de um homem chorando e era o meu ex-marido”, conta a idosa. O pai dos seus filhos estava em um estado avançado de esclerosa múltipla, uma doença neurológica autoimune e incurável que afeta principalmente os músculos e a coordenação motora. “Ele estava sozinho e precisava de cuidado por isso veio morar aqui. Eu e meus filhos cuidávamos dele”. Depois de oito anos de cama, sendo cuidado por Maria, seu ex-marido faleceu, no dia 11 de março de 2011. “Eu o perdoei, porque aprendi com Deus” desabafa. “Ele me pedia perdão todos os dias enquanto estava aqui, acho que no fundo ainda gostava de mim”.

Um exemplo para as gerações

Dona Maria afirma com orgulho que, apesar das dificuldades, conseguiu criar bem os cinco filhos. Dos dois filhos homens, um é professor e outro, chefe de segurança. Das três filhas, uma é enfermeira, outra é funcionária pública e outra, massagista. “Todos têm juízo e não possuem vícios. Isso me orgulha bastante” ressalta. A idosa já tem dez netos e uma bisneta. “Tudo o que vivi valeu a pena por eles”.

Dona Maria com parte dos netos

Para Maria, o sucesso depende de trabalho duro e esse exemplo é passado de pai (mãe) para filhos. Ela ressalta que tem como referência a mãe, que apanhava café, desde que se entende por gente. “Lembro muito bem dela. Era baixinha, gordinha e fazia duas tranças enormes no cabelo. Depois que saí de casa pra trabalhar, sempre que a visitava ela ia na horta, catava couve, picava e me esperava com meu prato favorito, que é couve refogada”, conta a idosa com saudade.

Maria afirma que, apesar dos filhos não serem muitos chegados aos legumes ela tratou de estabelecer uma tradição entre a família, que persiste até hoje. “Todo domingo eu faço macarrão, frango e salada de maionese”, conta. “Inclusive, acabei de lembrar que tenho que pedir pro meu neto comprar frango”, finaliza.

Dona Maria com netos Breno e Raquel

Desde 2012, o projeto Minha Casa Minha Vida 2 prevê que mulheres separadas podem adquirir um imóvel mesmo sem a assinatura do cônjuge ou no caso em que não houve divórcio judicial. Essa modalidade é limitada às famílias com renda mensal de até três salários mínimos. A exceção só acontece quando o pai tiver a guarda exclusiva dos filhos. Somente neste caso, o marido ficará com o imóvel após a separação – Site do Governo do Brasil

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